Chegou meu cartão do banco eletrônico. Fui a um terminal no shopping e fiquei uns 15 minutos tentando me entender com a máquina, mas finalmente consegui. Acho esses pequenos mistérios do quotidiano deliciosos. Qual o lado certo para enfiar o bilhete do ônibus na maquininha do lado do motorista? Quais os botões certos para se apertar no caixa eletrônico?
Quando instalaram a linha de telefone fixa tive que comprar um aparelho. Comprei o telefone sem fio oferecido pela PT Telecom e o bicho tem mais tecnologia do que o meu celular. Manda e recebe mensagens SMS, tem não sei quantos tipos de funções do tipo agenda, despertador, etc. Fiquei impressionada. Quem instalou a linha foi um senhor negro, cabo-verdiano, simpaticíssimo. Que vive aqui há 29 anos. Aliás, quem pensa que a maior colônia de estrangeiros em Portugal é de brasileiros engana-se. Em primeiro lugar estão os representantes da Ucrânia. Em segundo, destronados recentemente, estão os nativos de Cabo Verde.
Ainda faz frio. A média de temperatura está na casa dos 10/12 graus. O que é delicioso para quem tem agasalhos adequados. Eu, que vim quase sem nenhuma roupa quente ando meio friorenta. Tem chovido muito, acompanhado de um vento gelado que piora ainda mais as coisas. Como o meu guarda-chuva é um daqueles dobráveis para viagem, ele vive virando. Aliás, essa é mais uma prova de que não sou portuguesa: não carrego um daqueles guarda-chuvas enormes de cabo de madeira.
Estou ficando perita em identificar estrangeiros nas ruas. É fácil demais. Primeiro as roupas. Ou são de cores mais alegres, ou são de corte mais elegante. A cor da pele também ajuda muito, o modo de andar é visivelmente diferente. Os portugueses são extremamente sóbrios no trajar, a maioria das roupas é pra lá de conservadora, sabe roupa que tia-avó usa em funeral no Brasil? Saia reta, casaquinho, broche na lapela, meias opacas e sapatos pesados? É isso. E tenho visto um número impressionante de casais “étnicos”, negros com brancas e brancos com negras... a parte branca é sempre portuguesa... alguém ainda precisa saber de onde vem a miscigenação no Brasil?
Fiz meu primeiro passeio realmente turístico, daqueles de andar com câmera fotográfica e tudo no Domingo de Páscoa. Muitos turistas zanzando pra lá e pra cá. Principalmente na parte baixa da cidade. Em uma das esquinas mais movimentadas da região, bem na frente do Elevador Santa Justa, encontrei um grupo peruano tocando música. Sempre tem um em qualquer lugar do mundo. Será que são os mesmos? Juro que já vi aqueles caras na Estação da Sé. Será que pertencem à mesma família? Será que são uma espécie de franchise? Porque é sempre tudo igual. As caras, as roupas, os instrumentos e as fitas cassete com as mesmas músicas que se ouve em Nova York, Paris ou São Paulo... fico intrigadíssima com eles...
Momento Pênis também é arte
Vi um show inusitado de uma dupla australiana, chamado Puppetry of the Pênis . São dois australianos malucos que ficam nus no palco por uma hora, fazendo “instalações” ou “origamis” com seus respectivos apêndices. Foi no Teatro Tivoli, na Av da Liberdade, um belo teatro (ex-cinema) com camarotes e tudo. Mas o mais divertido do espetáculo foi ver a reação da platéia portuguesa, que estava completamente encabulada. As pessoas riam muito, mas na hora de interagirem com os dois ficavam absolutamente tímidas e eu achei isso delicioso de ver. Surpreendentemente, havia muitas senhoras de cabelos brancos e tailleur na platéia. Sempre em grupos de 3 ou 4. Às vezes acompanhadas por uma mulher mais jovem, e esta sim, visivelmente constrangida por estar ali. Mas os dois australianos estavam se divertindo muito às custas da portuguesada na platéia. Eu estava no 1º balcão e, sendo assim, nenhum australiano pelado sentou no meu colo (oooohhhhh...)
25 de abril foi feriado aqui. Comemoração da Revolução dos Cravos.
Momento História de Portugal
25 de abril de 1974 – Revolução dos Cravos. Movimento das Forças Armadas, composto por oficiais militares de esquerda que derrubou num golpe praticamente sem sangue, o regime de Marcelo Caetano que, se não me engano foi para o Brasil...
Eu pretendia ver o desfile, mas choveu e a temperatura caiu para 10º. O desfile que me desculpe, mas não dava para abandonar o edredom... Sábado o sol apareceu novamente e eu fui ao supermercado aqui perto, chamado Pingo Doce. Tem um segurança muito, mas muito mal encarado, que fica andando pelos corredores com ar de “eu sou ruim” e de vez em quando vai paquerar a mulatinha de Cabo Verde que atende o balcão de frios...(é mal encarado, mas é português, raios...) Mas o homem é francamente agressivo e eu confesso que tenho medo dele. Tenho impulsos de dizer “olha estou passando novamente por esse corredor porque esqueci de pegar um produto, mas é só dessa vez, eu prometo que não passo aqui novamente, o senhor me desculpe viu?” . Depois de voltar para casa e colocar tudo na geladeira fui até a Fundação Gulbenkian ver uma exposição de aquarelas de Turner no museu. Aliás, o nome Gulbenkian aparece em vários lugares de Lisboa. E é inclusive nome de uma grande avenida.
Momento Portugal Moderno
Museu Calouste Gulbenkian - Criado graças ao rico magnata armênio do petróleo, que mudou-se para o neutro Portugal durante a 2ª Guerra Mundial, o museu faz parte da instituição beneficente legada a Portugal pelo multimilionário (a Fundação Calouste Gulbenkian, que além do Museu Gulbenkian e do Museu de Arte Moderna, possui uma orquestra sinfônica, uma companhia de balé, bibliotecas de arte e patrocina bolsas e atividades artísticas. http://www.gulbenkian.pt/
Os jardins da Fundação são uma delícia à parte. E eu acabei passando a tarde lá dentro.
Um amigo me informa que saiu aí na Folha de São Paulo que Portugal é o país mais preguiçoso da EU. E é verdade. Não vejo ninguém se exercitando nos parques ou nas ruas. O conceito de exercício é praticamente inexistente. Há duas academias gigantescas nos dois shoppings da cidade, que custam uma fortuna para freqüentar. Eu fui andar no parque de manhã cedo e só encontrei estrangeiros. Principalmente americanos/as. Todos correndo é claro, que americano não anda, faz jogging. Sempre com shorts, moletom de universidade e boné.
Momento sociedade: As mulheres portuguesas.
Alguém me explica porque as mulheres portuguesas além daquela cara de poucos amigos que têm o tempo todo, gritam tanto com os coitados dos homens portugueses? Não é brincadeira não. Em todo lugar, em qualquer idade acima dos 18, não se espante se, de repente, naquele casal discreto ao seu lado, a parte feminina desandar a falar alto, quase sempre desancando o homem que, por sua vez, nunca levanta a voz com ela, fica olhando para os lados, completamente embaraçado, vermelho de vergonha, enquanto ela continua descendo o cacete nele. Os motivos variam, já ouvi uma namorada gritando com o namorado porque ele estava falando demais no celular, uma mulher de meia-idade irritadíssima com a marca de molho de tomate errada que o marido havia colocado no carrinho do supermercado quando já estavam no caixa e uma velhota de uns 70 anos a berrar na calçada com o velhote que havia estacionado mal o carro... o pior é que elas repetem tudo o que eles dizem e a cada frase os decibéis vão crescendo de intensidade...seja qual for o motivo é impressionante ver a transformação delas em uma verdadeira banshee... eu fico boquiaberta...mais boquiaberta em ver que eles não dão um tapão no meio da orelha delas...(
Momento Que Língua é Essa?
- Comprando pratos e talheres, a moça do caixa me pergunta: “é para oferta?” (???) levei alguns segundos para entender que ela queria saber se era para embrulhar para presente...
- Anúncio de uma marca de chocolates “dá vontade de trincar”, ou seja, dá vontade de morder.
- Aviso do homem do tempo na rádio: “não deixem de sair com os chapéus de chuva”, entenda-se “guarda-chuvas”.
- “Não tem hipótese” – não tem jeito, não tem como.
machucar – magoar – ferir – aleijar
Se você cair e se esfolar todo, escorregar e bater a cabeça você magoou-se. Magoado também vai ficar se alguém partir seu coração.
Se você se cortar e sair sangue você feriu-se.
Se um carro bater e amassar, o carro machucou-se. Mas quem estava dentro do carro não se machuca nunca porque não é feito de lata.
Um jogador de futebol que leva um carrinho por trás e cai, aleijou-se. Se eu torcer o pé, alejei-me. Mas um aleijado é um deficiente físico.
Confuso? Também acho. Resumindo: quem se machuca são coisas de lata, pessoas magoam-se (física e emocionalmente). Saiu sangue? Feriu-se. Caiu em cima de uma lata de molho de tomate e teve uma contusão feia? Além de aleijado fica magoado e a coitada da lata toda machucada. Ficou claro agora? (risos)
Momento Estou em Portugal
Já não é de hoje que sempre que falo com alguém ao telefone, ou escuto uma conversa de outras pessoas ao celular, depois das despedidas há uma frase meio resmungada, meio murmurada no fim. O maior mistério. Mas, na loja onde comprei o telefone, descobri o que é que eles falam, enquanto ouvia a balconista atender um cliente pelo telefone:
- “não há problemas Dona Fulana, reservo o aparelho”
- (cliente fala algo)
- “de nada. Adeusinho.”
- (cliente fala)
- “Adeusinho (novamente). Com licença” (murmurado)
É isso! Eles pedem licença para desligar...
Momento gastronomia portuguesa
Estou apaixonada pelos pães daqui. O que é ruim para quem quer manter a forma. Mas todos (com exceção de um horroroso chamado Carcaça) são uma delícia. São duas, às vezes três, fornadas diárias nas padarias. Os nomes são engraçados: padeirinha, papo seco, broinha de mistura, carcaça, pão de Mafra, tem mais, mas ainda não comi e, portanto não sei o nome.
Não vou nem falar do azeite daqui que é covardia. Mas fiquei impressionada com o fato de que quase todos os legumes e frutas vêm da Espanha. Aliás, comercialmente falando, Portugal foi completamente invadido pela Espanha, bancos, empresas, produtos, etc. Perto de casa há uma loja de seis andares da rede de lojas de departamento El Corte Inglês (o nome é um horror, eu sei, mas a loja é finíssima. A invasão é turística também. Só se esbarra em espanhóis nas ruas. Cada um mais metido e mal educado que o outro. (Os leitores descendentes de espanhóis que me desculpem, mas é a mais pura verdade, eles são uns grosseirões). Aliás, os portugueses detestam os espanhóis. Séculos de guerras e rivalidades contra o único vizinho do país geraram essa má disposição. O fato de que a economia espanhola dá de dez a zero na portuguesa não ajuda muito a amenizar as coisas. Peguem a rivalidade entre brasileiros e argentinos e multipliquem por 10. É por aí.
Momento Brasil em Portugal
A loja da Body Shop no shopping perto de casa tem balconistas brasileiras, clientela brasileira e da última vez que estive lá parecia que estava no Brasil. O balcão do Café do Ponto no mesmo shopping também tem dois atendentes brasileiros. O bilheteiro do teatro era brasileiro. Todas as lojas do Boticário têm pelo menos uma vendedora brasileira. Na Fundação Gulbenkian todos os atendentes do restaurante eram brasileiros. A vendedora da loja onde comprei talheres era brasileira. Estou convencida de que todos os atendentes em restaurantes, lojas e similares deste país são brasileiros. E todos estão na casa dos 20/25 anos. Como é que essa meninada veio parar aqui?
Bom é isso gente. Semana que vem tem mais.
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